segunda-feira, 9 de maio de 2016

Poemas de Elvé Monteiro de Castro

 

         Belos Beijos  

 "These pretty pleasures might me move,

To live with thee and be thy love." Shakespeare.

 

       "Por estes prazeres de tanto ardor,

       vou viver contigo e ser teu amor." Trad. Elvé .

 

       Invisto em ti todo o meu tempo,

       tempo que não tem preço,

       tempo que voa.

       Olho teu rosto e vejo em teus olhos cerrados

       faíscas de luz,

       ou arregalados, com um medo que seduz.

       Toco em teu lábio e sinto o gosto de um beijo

       que, se pudesse, não acabava nunca mais.

       Abraço-te, e meus pelos se eletrizam

       no contato com a relva de tua pele nua.

       Tuas pernas são troncos de um Templo

       que venero.

       Dou-te de presente um cinto, brocado em hera.

                    Se por estes prazeres sentires ardor,

                   então, viva comigo e seja o meu amor.

 

            na Lu A

 Minha primeira namorada foi a Lua/...

da casa em que eu morava, ela subia nua,

no horizonte azul de minha juventude.

Do poema "Sonho Real" -  Quases, emc.

 

Amor! Você está tão perto de mim

e, ainda assim, tão longe. Não perca tempo.

O tempo é tão curto, e a vida voa,

e lembre-se de tudo que eu lhe disse:

            a fome que tenho de sua beleza;

            a sede que tenho de seu perfume;

            e os milhares de beijos pra lhe dar.

            Paciente, vou esperar com ciúme.

Se um dia, ou melhor, se uma noite,

você quiser saber e provar qual

é o gosto do meu amor, então

entre. A porta está sempre toda aberta.

            No escuro, tire a roupa e deite nua,

            a meu lado e, sem dizer palavra,

            deixe seu corpo lutar contra o meu.

            Venha  cavalgar sem medo e pudor.

Vamos provar que a vida vale a pena.

Depois, pegue sua roupa e saia de mansinho,

e, leve, para sempre, a lembrança de meus

                                                     carinhos.

 

      Ode ao Átomo e ao Amor

 "Vida: um acidente curioso ocorrido

   num canto do Universo." 

                        Paulo Guedes.

 Nosso amor nasceu estranho como o cosmos.

No início não havia nada.

Nem espaço, nem tempo, nem vácuo.

Nada mais que um ponto – uma singularidade,

onde se concentrava toda a energia do mundo.

 

E ela explodiu, e explodiu, e expandiu

seus trilhões de graus, e começou a esfriar,

há mais de treze bilhões de anos atrás,

e um átomo se coagulou – era o prenúncio

de que você poderia nascer um dia.

 

Seu nome não era Vega nem Lira. Era Belatriz.

E a Vida começou a crescer até chegar

ao baobá, jatobá e jequitibá,

e, depois, ameixa, amora, maçã e o amor.

 

« Mon amour est née avec la fraischeur

   du fruit vert »

 "Meu amor nasceu com a doçura

  de uma fruta fresca",

 

sazonada, e devorada antes do tempo.

 

Coube a mim a ventura de tê-la entre os dentes.

Ela veio cheinha de deliciosas carnes,

cabelos pretos em longas madeixas perfumadas,

seios enormes, prenhes a ser sugados,

olhos e cílios, lábios e língua,

toda pronta pra ser beijada e amada.

 

         Zé com duas Muié

 "...tomou as suas duas mulheres,

    e as suas duas escravas,

    com os seus onze filhos..."

             Bíblia, Gêneses, 32-21.

  Sei que quase todos têm uma,

mas, não sei por que é que é,

eu tenho duas muié. 

 

Uma é madura, meio tanajura,

mas é uma gostosura de muié.

A outra é novinha, meio bobinha,

mas faz de tudo que a outra não qué.

 

Uma eu beijo da ponta do pé,

até chegar ao ponto que ela qué.

A outra, beijo dos cachos dos cabelos

até dentro do facho dos pelos.

 

Quando uma me falta,

sinto como se tivesse chupado

só a metade das laranjas do pé.

 

Não sei por que é que é,

mas só sei viver com

                                   duas muié.

      Cozido Muito Doido*

"Tudo que se mexe é pornográfico"

            Jean Luc Godard

 "...com capricho tampo

     o restinho de molho na panela."

            Adélia Prado.

 Meta a colher de pau lá bem no fundo e mexa,

e mexa, mexa, mexa,

mas, primeiro, prepare a panela e o tempero:

use o dedo e besunte a base com barrela;

com calma, faça um molho bem molhado,

de azeite, creme e grelo de bambu.

 

Paciente, com a ponta da língua, experimente.

Aparte as carnes: duas coxas e costela,

linguiça com dois ovos, peito de peru.

Uma cenoura inteira, (cenoura não se pica)

lavada, descascada e temperada

co' azeite virgem, se possível, extra-virgem.

 

Quando o caldo estiver bem viscoso e macio,

meta a cenoura ou dente de alho grande e grosso.

            It could as well be an eggplant, big a lot,

            but at times it doesn't fit into the pot.

             Pode também ser uma berinjela

            mas, às vezes, não cabe na panela.

 Aqueça "a cenoura" até ficar bem roxa.

Sinta o sabor, devagar, antes de murchar.

 

Ponha tudo em panela funda e em fogo brando,

junte um saco com ervas de cheirinho doce.

Se ferver, baixe o fogo e comece de novo.

Bom cozido demora mais de duas horas.

E, se estiver no ponto e a gosto, a panelada,

meta a colher de pau lá bem no fundo e mexa,

     e mexa, mexa, mexa, até de madrugada.                          

 *Poema dedicado a Elke Maravilha.




Convite Exposição Ferreira Gullar

Segue o e-flyer eletrônico da inauguração.